#04 | Da alegria. Feliz coincidência.

Quinta feira, 24 de abril.
A projeção no Largo da Alegria foi um momento de satisfação total.
Desde o princípio, já houve indícios de que ali seria um local de maior movimento norturno. Eu já tinha feito projeções nesse local em outra ocasião e o espaço me agrada pela distância entre as casas, pela variedade de “superfícies” para projetar. Sem falar em uma casa especialmente, que é toda branca e bem larga, uma telona mesmo.

Quando chegamos, estava tudo quieto. Fomos arrumando as coisas, esticando a extensão e ligando o projetor. Começamos a projeção e fiquei tranquila, sentei ao lado do projetor e fui experimentando umas imagens, mudava a posição da projeção, aproximava ou afastava de algumas casas… tentei projetar nos telhados, mas ficou escuro.
Aí começaram a aparecer pessoas. Primeiro um rapaz, com um bebezinho no colo. Ele se assentou na grama e ficou assistindo, muito compenetrado. Mas não deu conversa. Tinha também um pessoal barulhento numa das casas ao lado; eles assistiam novela com o som altíssimo. Depois passou um senhor de bicicleta que parou para olhar e ficou uns 5 minutos, interessado.

Foi aí que apareceu um grupo de crianças, um bando! Tinha uns 8 meninos, de várias idades, meninas também. Eles chegaram muito de repente e muito agitados, já fazendo perguntas “vai ter projeção?!”, “o que você vai passar?”. E no começo fiquei um pouco assustada, atrapalhada. Mas os meninos ficaram instigados e foram se acalmando, olhando, começaram a perguntar o que era aquilo, onde era aquilo. Quando viu carros, ruas asfaltadas, um menino perguntou se era o Serro. E outro falou que não, não era não. Aí resolvi conversar com eles, contei que era Belo Horionte, que eu morava lá, mas que podia também ser ali mesmo, em Milho Verde, olha só se não parece que esse pessoal tá aqui? Pronto! Bastou isso e eles foram correndo para perto da imagem e começaram a interagir com os elementos da cena, com as pessoas filmadas, brincaram de correr atrás do ônibus, sentaram no banco, pediram cerveja pro homem da barraquinha de feira.

Foi muito bom ver isso tudo acontecendo. Praticamente todas as “provocações” que eu tinha colocado propositalmente foram percebidas por eles. Mas foi além! Aquela história toda de construção polifônica das cenas é possível, é verdade, realmente os elementos interagem e dá mesmo a impressão de que as superfícies se misturam.
Teve uma hora em que isso ficou muito nítido: um dos meninos se aproximou da barraquinha de skol e disse: “ô de casa, vim comprar cerveja”. Nessa hora, ele chegou muito perto da imagem, e também, claro, da casa sobre a qual estavámos projetando. Foi aí que um cachorro que estava preso do lado de dentro, começou a latir e o menino levou um susto, saiu correndo! Ficou parecendo que o cachorro estava “tomando conta” da barraquinha, marcou a proibição, do tipo: “cerveja não é coisa de menino”!

Mas fora todas essas brincadeiras, teve um momento especialmente bonito. Por coincidência, eu tinha levado nesse dia uma fita “reserva” com outras imagens, antigas, de Milho Verde mesmo. Como a projeção estava durando muito, as imagens que eu tinha preparado acabaram e eu coloquei essa outra fita. Eram crianças brincando, soltando pipa e depois jogando bola. Achei que fosse ser legal, mas não podia imaginar que eram eles próprios! Foi uma surpresa, para mim, e para eles. Eles adoraram, ficaram narrando tudo que ia acontecer, rindo um do outro. E eu rindo também, boba alegre.




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